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Empresas do setor foram reconhecidos na Constituição como fundamentais para a sociedade, graças a reforma tributária

Atualmente são cerca de 1,5 milhão de negócios no setor de alimentação fora do lar espalhados pelo Brasil. Foto: Tânia Rego/Agência Brasil

Serra da Saudade (MG) é o menor município do Brasil pelo novo Censo do IBGE. São 883 habitantes - de uma ponta a outra da cidade, não dá 1 km. O último homicídio por lá ocorreu em 1967, há 56 anos.

Segundo o Correio Braziliense, não há na cidadezinha posto de combustível, hotel, farmácia ou hospital. Mas os dados da Receita registram sete estabelecimentos de alimentação fora do lar no município. Ou seja, por falta de acolhimento, boa prosa, sabor e diversão, também não se morre no lugar.

Assim é com os 5.565 municípios do Brasil: todos eles têm bares, restaurantes, lanchonetes, padarias servindo refeições, lanches, bebidas. Movimentando as ruas, servindo de ponto de informação, segurança e lazer.

Hoje são cerca de 1,5 milhão de negócios (considerando os seis CNAEs principais do setor), tocados por mais de 2 milhões de empreendedores, se contarmos as empresas que têm sócios.

Que dão emprego a quase 5,6 milhões de pessoas, segundo a PNAD Contínua. Ou seja, são mais de 7,5 milhões de famílias que tiram seu sustento todos os meses, de modo direto, do trabalho em um bar ou restaurante.

Mas não é só. O setor também sustenta uma cadeia imensa de fornecedores e prestadores de serviços, ampliando este número em mais alguns milhões.

De móveis e utensílios a embalagens, de toalhas de mesa a equipamentos de cozinha, de alimentos a itens de limpeza, de sistemas eletrônicos de venda à manutenção de ar-condicionado, há uma lista interminável de empresas que dependem dos bares e restaurantes. Todas elas também dando emprego e movimentando a economia.

O ano de 2023 foi de recuperação para este setor, atingido de modo desproporcional e injusto durante a pandemia, com estados e prefeituras impondo fechamentos e restrições que tiraram o faturamento dos negócios, sem uma contrapartida que permitisse a sobrevivência das empresas, como ocorreu em mais de 100 países.

Muitos não resistiram e fecharam, e muitos ainda estão pagando as contas, apertados por dívidas e empréstimos tomados nos tempos bicudos.

Vamos analisar um pouco nesta reportagem alguns aspectos que explicam esta trajetória de recuperação, que faz com que o setor feche 2023 com um faturamento estimado pela Abrasel em R$ 414 bilhões – um crescimento de 4,5% em relação a 2022, cerca de 1,5% a mais do que o crescimento estimado do PIB brasileiro no ano.

Inflação

No acumulado de 2022, embora um pouco acima do índice geral (5,79%), a inflação no setor (7,47%) fechou muito abaixo do índice de aumento dos alimentos de bebidas (11,64%) e teve quase metade do aumento registrado na alimentação dentro de casa (13,23%).

Isso se deveu ao temor dos empresários em repassar os aumentos dos insumos para o cardápio, já que no começo do ano ainda havia restrições em alguns estados – e mesmo depois disso ainda houve um processo de reconquista dos consumidores, que foram voltando aos poucos a frequentar os estabelecimentos.

Pesquisa da Abrasel realizada no fim de 2022 mostrava que menos da metade (44%) dos empreendedores acreditavam ter conseguido um aumento no faturamento acima da inflação do ano.

Em 2023, o quadro começou a mudar lentamente, com um pouco mais de espaço para a recomposição dos preços nos cardápios, principalmente no primeiro semestre do ano. No acumulado do ano até novembro, a inflação do setor atingiu 4,75%, acima do índice geral de 4,04%, apontando para uma recuperação mais significativa.

Mesmo assim, muitos ainda encontravam dificuldades para repassar aumentos. De acordo com um levantamento realizado pela Abrasel com 3.190 empreendedores em todo o país no final de novembro, 29% afirmaram não conseguir ajustar os preços dos cardápios conforme a inflação nos últimos meses de 2023.

Outros 39% realizaram reajustes conforme a inflação, enquanto 28% aumentaram os preços, mas abaixo do índice geral. Apenas 4% indicaram ter feito ajustes acima da inflação.

Mudança de perfil do mercado

Durante a pandemia, na medida em que muitos fechavam as portas, outros encontraram no empreendedorismo no setor uma saída para sustentar a família. Em março de 2020, antes da pandemia, 50% dos CNPJs do setor eram de microempreendedores individuais (os chamados MEIs), cujo faturamento máximo anual é de R$ 81 mil.

Esta participação chegou a 68% em 2023. Muito maior do que em outros setores, como o comércio (47%), indústria (63%) e agropecuária (apenas 6%). Além disso, 95% dos bares e restaurantes do país se enquadram como microempresas, pelos critérios da Receita Federal, com faturamento de até R$ 360 mil anuais.

No entanto, depois de abril de 2023 começou um refluxo dessa onda de criação de MEIs. Depois de atingir 1,04 milhão de empreendedores individuais em abril, o setor viu esse número cair mês a mês, chegando em dezembro com cerca de 880 mil MEIs.

Ou seja, 160 mil CNPJs a menos nessa categoria. Ao mesmo tempo, as empresas com faturamento superior a R$ 81 mil ao ano voltaram a crescer (isso engloba desde microempresas até as empresas que se enquadram no regime fiscal de lucro real e lucro presumido).

Em janeiro eram cerca de 500 mil, número que cresceu para cerca de 570 mil no fim de 2023. Ainda longe das 730 mil empresas não-MEIs que havia em março de 2020, antes da pandemia, mas ainda assim um crescimento expressivo.

Um cruzamento dos dados do número de empresas e dos empregos no setor mostra uma conclusão curiosa: o setor aprendeu a fazer mais com menos. Em 2019, havia cerca de 1,25 milhão de empresas no setor, que empregavam por volta de 5,8 milhão de trabalhadores.

No fim de 2023, as cerca de 1,5 milhão de empresas abrigavam 5,6 milhões de empregos. Ou seja: o número de empresas cresceu, mas os empregos se mantiveram em nível abaixo de 2019.

Claro que o aumento da proporção de MEIs no setor ajuda a explicar isso, mas não só. Também houve um aumento de produtividade acelerado durante a pandemia. A chave para isso? Digitalização.

Softwares no controle

O aumento de produtividade e eficiência com o uso de softwares e ferramentas digitais foi a chave para a sobrevivência dos negócios durante a pandemia. Como legado, hoje os bares restaurantes estão muito mais plugados, tanto na operação como em outros aspectos do dia a dia, como o marketing. É o que mostra pesquisa realizada pela Abrasel em 2023, com mais de 1500 empresários de todo o Brasil.

Os tempos em que anotações a lápis e cadernos de fiado eram suficientes ficaram para trás. Com a adoção de estratégias digitais, muitos estabelecimentos passaram a oferecer serviços de delivery e aprimoraram (ou até mesmo inauguraram) suas presenças nas redes sociais.

Além disso, a gestão dos negócios também passou por uma revolução, com a crescente adoção de softwares para controlar o fluxo de caixa, compras e pagamentos.

Segundo o levantamento, 83% dos estabelecimentos usam hoje algum tipo de software para controlar as vendas, enquanto 75% empregam ferramentas para o controle financeiro e 67% adotam soluções para o serviço de delivery. No entanto, ainda há espaço para crescimento em áreas como controle de reservas, aspectos jurídicos e segurança alimentar.

Estes resultados demonstram a capacidade de adaptação e a busca constante por inovação do setor de bares e restaurantes, que tem se reinventado. A digitalização se tornou uma aliada essencial para a eficiência operacional, para o alcance de novos públicos e para o relacionamento com o cliente.

Quase a totalidade dos estabelecimentos (99%) possui presença em, pelo menos, uma rede social para fins de marketing e relacionamento com os clientes. As plataformas mais utilizadas são Instagram, WhatsApp e Facebook, nesta ordem. Além disso, 35% dos estabelecimentos possuem seu próprio site.

No entanto, apenas 69% dos estabelecimentos possuem o hábito de acompanhar e responder de forma personalizada às avaliações nas redes sociais. O tradicional e-mail ainda é uma ferramenta amplamente utilizada, com 34% dos estabelecimentos utilizando-o como meio de comunicação.

Taxa de sobrevivência

Uma outra boa notícia para o setor é que, além de estarem mais produtivas, as empresas também estão permanecendo mais tempo no mercado, e isso ficou bem claro em 2023.

Segundo dados da Receita Federal, quando analisadas as empresas abertas desde 2012, hoje a média de sobrevivência de uma empresa no setor é de 3,6 anos. Esse número era de 3,4 anos no começo de 2023.

Ou seja, em um ano, subiu quase 2 meses. Ainda é uma das médias mais baixas entre todos os setores: a liderança é a da agropecuária, com 4,9 anos, seguida pela indústria (4 anos), comércio (4 anos) e construção (também 4 anos).

Perfil dos Empreendedores e dos Empregados

Outro estudo da Abrasel se debruçou sobre cerca de 250 mil empreendimentos de alimentação fora do lar que têm sócios. E a análise mostra um perfil mais jovem e feminino de quem empreende no setor, na comparação com outras áreas da economia.

Quase metade (45%) de quem tem uma sociedade num bar ou restaurante está na faixa entre 21 e 40 anos, número maior que no comércio (37%), indústria (32%), construção (35%) e agropecuária (23%).

As mulheres também têm participação maior nas sociedades do setor do que em todos os outros segmentos. Representam 38% de quem tem sociedade num bar e restaurante, contra 36% na agropecuária, 35% no comércio, 31% na indústria e 24% na construção civil.

Além do enorme contingente de empreendedores, o setor também se coloca como um dos maiores geradores de empregos no país, com quase 6 milhões de pessoas trabalhando (de modo formal ou informal) nos estabelecimentos, sem contar os empregos gerados em fornecedores e prestadores de serviços.

E o retrato também é de diversidade — hoje as mulheres são a maioria de quem trabalha em bares e restaurantes, com 52% de presença. Além disso, 61% são pretos ou pardos.

Os jovens também têm forte presença: 1 em cada 5 trabalhadores do setor tem hoje entre 20 e 29 anos. Apesar da juventude, a maioria apresenta boa qualificação. Entre os informais, quase metade (49%) tem ao menos o ensino médio completo, número que chega a 75% entre os trabalhadores formais.

Essas características fizeram com que o setor fosse reconhecido como essencial na reforma tributária, com desdobramentos nos próximos anos. O modo como o setor terá o tratamento diferenciado será estabelecido na regulamentação da reforma – com implementação entre 2026 e 2032.

As possibilidades incluem redução das alíquotas, mudanças na base de cálculo e nas regras de creditamento (o aproveitamento de crédito de impostos previsto na reforma). Mas, regulações à parte, o que importa é que a Constituição agora reconhece a importância e a essencialidade do setor.

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