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Por Paulo Solmucci, presidente-executivo da Abrasel

Em 2001, aos 16 anos de vida, a Abrasel chegou à sua idade intermediária entre a fases adolescente e adulta. Começou a adquirir maior autonomia em relação ao seu vínculo umbilical de origem, que era o das mais luxuosas casas noturnas voltadas ao lazer e ao entretenimento dos reis da noite. A entidade passou, então, a buscar seus mais autênticos valores, com maior independência em relação aos progenitores.

Assim, nasceu naquele ano o primeiro plano estratégico, que lhe deu régua e compasso para as novas experiências de relacionamentos mais diversificados e duradouros. Incorporou ao seu leque de associados estabelecimentos de todos os portes, dos mais modestos aos mais luxuosos. Iniciou, por meio das seccionais, um processo de estadualização, deixando de ser quase que exclusivamente das grandes capitais. A seguir, foi se interiorizando dentro de cada um dos estados, abrindo unidades regionais.

Transcorrida uma década do primeiro plano estratégico, a Abrasel partiu para um segundo conjunto de metas sistêmicas. A nova investida estratégica ganhou o nome de ‘Centúria’. O plano vigorou no período 2011/15. Continha, entre outros alvos, o objetivo central de fazer com que o valor socioeconômico da entidade fosse percebido pelas lideranças do terceiro setor, do mundo oficial, das federações trabalhistas e patronais.

Uma vez obtido pleno sucesso no ‘Centúria’, modelou-se mais um elenco de ações estratégicas, para o período 2016/20, que recebeu a denominação de ‘Supernova’. O principal escopo do ‘Supernova’ era o de potencializar a tecnologia digital, de modo que a entidade se tornasse amplamente acessível no apoio aos bares e restaurantes espalhados pelos 5,57 mil municípios brasileiros. A partir do início de 2019, a plataforma Conexão Abrasel abriu-se às telas do país inteiro.

Esses inovadores avanços ocorreram sem precipitação, no momento certo. Escreveu Victor Hugo: “Nada é tão forte como uma ideia cujo tempo chegou”. Outro intelectual francês, o filósofo e sociólogo humanista Edgar Morin, constatou: “De tanto sacrificar o essencial em favor do urgente, acabamos por esquecer a urgência do essencial”. E assim se inspirou o lema do quarto plano estratégico da Abrasel para o período 2021/2025: ‘Omni’. A palavra vem do latim ‘tudo’, ‘todo’. São dois vocábulos que podemos remeter à palavra ‘inclusão’.

Para que haja inclusão é preciso que se confira urgência ao essencial de ampliarmos a nossa classe média, hoje sobretudo formada pelos que trabalham nas grandes empresas e na burocracia estatal. É imprescindível que ocorra, pela via empreendedora, a ascensão de largas parcelas da base da pirâmide aos estratos médios de renda. Trata-se de um movimento que está ligado a outra ação inclusiva de ampla escala, que é a cotidiana prática de uma atitude ostensivamente antirracista.

A nossa obstinação é transformar o Brasil em uma nação acentuadamente empreendedora, acabando com uma desigualdade que, no dizer do economista Eduardo Giannetti, “é obscena”. O país tem mais de 81 milhões de habitantes, a maioria negros, situados no espectro da pobreza. Isso significa 38% da nossa população, de 213 milhões de habitantes. Levantamento do IBGE mostra que, no ano de 2020, mais de 17 milhões de crianças e adolescentes, até 14 anos de idade, viviam abaixo da linha da pobreza. É o equivalente a 38,6% da população nessa faixa etária. Na base da desigualdade está o racismo urbanístico estrutural.

Nas favelas e periferias, desprovidas da mínima infraestrutura básica, volto a assinalar, a população predominante é negra. Onde a cidade está desprovida de infraestrutura, não há cidadania, há racismo estrutural. Nessas áreas segredadas, a precariedade é generalizada: moradias improvisadas em áreas de risco, ausência das redes de água e esgoto, lixo a céu aberto, falta de espaços públicos de lazer, de ruas pavimentadas e calçadas transitáveis.

O Estado brasileiro arrecada mal, gasta mal e sobra pouco para investir na inclusão social, urbanizando as favelas e periferias, em que a maioria da população é negra. Esses territórios são desconsiderados como partes da cidade e da cidadania. O desafio da Abrasel: a partir desta evidência, se engajar ainda mais na construção de um Brasil novo.

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