Notice: Undefined variable: base in /var/abrasel.com.br/revista/site/templates/head.inc on line 67

Espaço exclusivo para entregas alia aumento de faturamento com custos menores para operações de restaurantes, mas requer cuidados específicos

Dark mall da Delivery Center em Porto Alegre

Por Danilo Viegas

O crescimento constante do mercado de entregas em domicílio, em média 20% ao ano, segundo a Abrasel, está criando um novo formato de operação que dispensa o investimento em um ponto de vendas com as portas abertas à população. São as chamadas dark kitchens (cozinhas obscuras, em tradução livre), cozinhas instaladas com estruturas para atender apenas pedidos de delivery.

A tendência tem origem nos EUA quando, com o crescimento dos aplicativos de entregas, empresários passaram a montar novas cozinhas para abrigar mais de uma operação. Entre as vantagens neste tipo de negócio estão a não necessidade de uma fachada nem estrutura de salão, economia com mão de obra de atendimento, além dos aluguéis mais baratos do que pontos comerciais sofisticados como ruas de comércio e shoppings. O retorno financeiro é expressivo, empresários ouvidos pela Bares & Restaurantes dizem ter aumentado o faturamento de seus negócios em até 50% com o delivery feito a partir de suas dark kitchens.

Único brasileiro na lista e 39º colocado no ranking “The World’s 50 best”, que elege os 50 melhores restaurante do mundo, A Casa do Porco, em SP, é um exemplo de casas de sucesso que se adaptaram a nova tendência. Segundo Janaína Rueda, sócia da casa, o delivery já é responsável por 17% das vendas. Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo em outubro de 2019, a empresária afirmou que estava alugando um imóvel para servir de dark kitchen para o Grupo, que também abrange o Bar da Dona Onça e o Hot Pork. “Vou entrar forte neste mercado”, disse.

Enquanto alguns empresários enxergam na tendência uma chance de fidelizar mais clientes e aumentar seu faturamento - já que no delivery não há limite de espaço físico para atender os clientes - outros gestores estão se aventurando no setor de alimentação fora do lar com suas operações 100% voltadas ao delivery. No Greyhound, restaurante especializado em sanduíches fundado por Marcos Beaklini em meados do ano passado, a aposta no delivery é total. A casa, no Centro do Rio, não tem área para clientes. São 11 funcionários, seis dos quais encarregados apenas das entregas, em parceria com aplicativos. São cerca de cem pedidos por dia. “O espaço exclusivo para entrega me permitiu ter um custo bem menor do que se eu tivesse optado por um modelo tradicional de loja”, conta.

Ganha-ganha

As grandes plataformas de marketplace, como Ifood, Uber Eats e Rappi estão remodelando esta indústria com investimentos altos. Os aplicativos usam os imensos bancos de que dispõem para identificar a demanda por um determinado tipo de refeição em um bairro ou vizinhança da cidade. Então, buscam um restaurante que já usa sua plataforma de entrega e o ajuda a escolher o ponto para instalar a dark kitchen.

O investimento fica por conta do restaurante que, na maioria das vezes, fecha um contrato de exclusividade com o aplicativo: a cozinha trabalha, a portas fechadas, apenas para atender os clientes daquele serviço de entrega. Em troca, o delivery investe no marketing da marca, que só será exposta na sua plataforma, e ajuda a definir menu e preço.

Outras empresas apostam no conceito de dark mall, espaços com cozinhas exclusivas para delivery. A primeira a operar no Brasil, mais precisamente em 2018, foi a Delivery Center, tem possui dark malls em Porto Alegre, Rio e São Paulo. Na capital gaúcha, por exemplo, o prédio da empresa possui três mil metros quadrados e foi estruturado para acomodar 27 estabelecimentos.

Funciona assim: o estabelecimento quer incrementar suas vendas no delivery para além do restaurante físico ou operar inteiramente neste segmento, a Delivery Center fornece o espaço físico para que os alimentos sejam preparados, apoia na logística e na centralização dos pedidos. A empresa também possui hubs de distribuição instalados em shopping centers. A partir dessa rede, a empresa centraliza e gerencia os pedidos feitos aos lojistas desses centros de compra, sejam eles realizados pelos canais próprios de e-commerce ou por meio de aplicativos parceiros, como iFood, Rappi e Uber Eats, que são ao mesmo tempo concorrentes e parceiros. Hoje, a Delivery Center processa um volume de 160 mil pedidos mensais. Desse fluxo, 90% são relacionados a comida.

A loja Black Beef é cliente da Delivery Center. Com operações tanto em loja física em shopping center quanto em dark kitchen, o estabelecimento tem na cozinha obscura uma redução de 50% do custo em relação à loja física. A economia vem da estrutura da equipe, que é otimizada. O espaço físico, para se ter uma ideia, é de 37 metros quadrados no espaço alugado na Delivery Center, frente aos 107 metros quadrados no shopping. “Estamos mudando a forma de se fazer delivery”, diz Cristiane Mendes, diretora de estratégia e uma das fundadoras da Delivery Center.

O tripé do desafio para gestores

A executiva do Delivery Center aponta uma evolução no conceito de delivery que caminha para o full service, com soluções de gestão que facilitam a vida dos dois lados: empresários e clientes. “Existe um tripé de desafios para gestores quando o assunto é entrega em domicílio: custo, nível de serviço e reputação. Não tem como fugir disso. O próprio mercado faz a seleção elimina quem não atinge um certo grau de satisfação nessas áreas”, diz Cristiane.

Para garantir a qualidade de entrega no delivery, os chefs precisam se adaptar. Um dos principais desafios é a embalagem. Um dos principais erros dos estabelecimentos é utilizar o mesmo cardápio físico para o delivery. Segundo especialistas, é preciso que empresários avaliem a vocação do produto para o delivery. Para assegurar a qualidade dos pedidos, alguns pratos tradicionais da rede Outback Steakhouse, como a Bloomin’ Onion, a cebola empanada em formato de flor, não são ofertados via delivery. “Não entregamos a cebola porque pode chegar mal, dependendo do tempo em que a entrega for feita”, diz Pierre Berenstein, diretor-presidente da Bloomin’ Brands, que detém a bandeira Outback no País. Em contrapartida, a rede pode convidar os clientes de seu delivery para desfrutar o prato em uma das lojas. “Muitas vezes, damos um card para a pessoa comer a cebola de graça em um de nossos restaurantes”.

N'A Acasa do Porco, por exemplo, só são entregues o porco assado (San Zé), o porcopoca (torresmo com especiarias) e os sanduíches. "Alguns pratos não chegariam com qualidade", diz Janaína Rueda, sócia da casa.

“Neste mercado, menos é mais”, resume Cristiane Mendes, da Delivery Central. “São pequenos exemplos que fazem com que o cliente tenha uma experiência agradável. Às vezes é um molho especial entregue separado, que não venha no sanduíche, rúcula entregue num saquinho para que o produto chegue íntegro. Infelizmente a embalagem ainda é vista como um custo. O que o empresário que deseja investir em dark kitchen tem que entender é que entregar um produto mal embalado diminuí a recorrência do pedido”, diz.

O lado sombrio da nova tendência

A proliferação das dark kitchens no Brasil possuí um efeito colateral ainda sem solução definitiva: a facilidade de cadastro em certas plataformas digitais beneficia também o aumento de cozinhas obscuras que não possuem padrão de qualidade, higiene ou a mínima preocupação com normas de vigilância sanitária. Existem vídeos na internet de youtubers que se cadastram em plataformas e rapidamente ofecerem produtos apenas para mostrar ‘brechas’ no sistema. A concorrência com os ‘fundos de quintal’ pode ser financeiramente desleal, mas pode ser vencido com o carimbo de reputação dos empresários que seguem o tripé de custo, nível de serviço e reputação

O advogado Vinícius Oliveira, diretor do escritório de advocacia Totall Marcas & Patentes atenta para uma outra importante questão aos empresários de restaurantes que atuam no ramo de delivery. "Golpistas aproveitam a semelhança de nomes de alguns estabelecimentos para criarem contas em aplicativos de entrega de comida para se passarem pela casa e assim confundirem os clientes".

*Reportagem publicada originalmente na edição 131 da revista Bares & Restaurantes


Comentários