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Bate boca virtual entre clientes e proprietários de bares e restaurantes podem ir para Justiça; saiba como gerenciar situações e não aumentar os problemas

Por Danilo Viegas

Recentemente uma estudante de Criciúma (SC) foi condenada a indenizar um estabelecimento comercial em razão de comentários feitos em rede social que, no entendimento do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), extrapolaram os limites da liberdade de expressão, gerando danos morais. Na ocasião, a ré publicou no Facebook comentários afirmando que a cozinha que abastecia o estabelecimento era uma “porquice”, “sujeirada” e “fedorão”, e acusava o estabelecimento de inúmeras irregularidades de ordem sanitária, sem prova alguma.

A postagem de ódio sobre o restaurante de Criciúma foi compartilhada por cerca de quinze usuários e, mesmo não tendo indicado expressamente o local, algumas pessoas chegaram a identificar o estabelecimento. Condenada em primeira instância ao pagamento de R$ 5 mil, a ré recorreu da decisão e a 1ª Câmara de Direito Civil do TJSC acolheu parcialmente o recurso, reduzindo o valor da condenação para R$ 2 mil em razão da capacidade econômica da infratora.

O relator do recurso ressaltou que “caso a ré estivesse preocupada tão somente com as condições insalubres do ambiente, poderia ter se limitado a descrever a situação sem denotar qualquer cunho depreciativo ou difamatório”, e que “os comentários veiculados pela ré em desfavor do estabelecimento autor excederam seu direito a informar e opinar sobre os fatos ocorridos e, ademais, denotaram cunho difamatório”.

No entendimento do advogado Anderson Ramos Augusto, gerente jurídico da Câmara de Dirigentes Lojistas de Florianópolis, a decisão do TJSC é acertada e merece elogios. “Nos últimos anos a internet como um todo e as redes sociais, em particular, se tornaram terreno fértil para a disseminação de publicações e comentários que, à luz da legislação vigente, constituem nítido abuso de direito, consistente no ato deliberado de malferir a honra e a credibilidade alheias. Isso sem contar o fenômeno das fake news, cujo potencial de induzir o leitor ao erro é objeto de imensa preocupação mundo afora”, diz.

O advogado ressalta que o direito de o cidadão expor suas críticas quando entender necessário é assegurado pela Constituição Federal, desde que esse seja exercido nos limites certos e determinados da lei, sob pena de violar direito alheio, pouco importando se o alvo de tais críticas for uma pessoa física ou jurídica.

Boas práticas

O episódio levanta uma série de questões sobre como os perfis virtuais de bares e restaurantes devem reagir em situações como essas, nas quais o importante é gerenciar o problema, e não aumentá-lo com discussões.

De acordo Daniel Borges, especialista em marketing digital e sócio da BrainCloud, existem boas práticas que minimizam o risco de bares e restaurantes discutirem com clientes por meio das redes sociais e podem evitar processos na Justiça. Segundo ele, é preciso separar de forma bastante clara o que é um mero feedback do que pode ser caracterizado como mensagem de ódio gratuito.

“Caso a mensagem se encaixe na primeira situação (feedback), o ideal é sempre se posicionar de maneira aberta a receber críticas, mostrar a possibilidade de mudanças na organização, escutar os clientes, mas não expor ou prometer nada frente aos seguidores”, orienta. O importante neste caso é passar a sensação de zelo para o público e, de fato, iniciar o diálogo, buscando resolver a situação no espaço privado (mensagens inbox). “O errado é fazer falsas promessas, como: o restaurante dizer que, pelo mau atendimento ao cliente vai demitir, imediatamente, o garçom – o que por ventura pode não ser cumprido por não ser tão simples e rápido assim”, ressalta.

Na segunda opção, quando há na mensagem um cunho depreciativo ou difamatório, o consultor sugere que a pessoa que fez a postagem seja banida da página, o conteúdo documentado e, posteriormente, retirado do ar para que as devidas providências jurídicas sejam tomadas. “Nas questões de injúria, o ódio pode nem ser contra o estabelecimento, mas sim contra outros consumidores que também frequentam o lugar”, afirma.

Para o advogado Percival Maricato, as redes sociais são algo novo, “o que não isenta as pessoas de as usarem com cuidado e agirem com respeito e responsabilidade para com as outras”. Segundo ele, se o juiz determinar, logo no início ou na sentença, a retirada da mensagem, a mídia social é obrigada a fazê-lo, sob pena de multa ou até suspensão de atividade. As indenizações, nos casos mais comuns, têm sido arbitradas entre R$ 2 mil a R$ 10 mil.

De acordo com o Marco Civil da internet, sancionada pela então presidente Dilma Rousseff em 2014, a disciplina do uso da internet no Brasil tem como princípios a garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição Federal. Para juristas, como Daniel Levy, autor da obra Responsabilidade Civil, o grande desafio do século 21 é conciliar o direito à informação, à manifestação do pensamento com a violação da personalidade e a injúria recorrentes na internet. Aos poucos, decisões judiciais como em Santa Catarina vêm mostrando que a web não é uma “terra de ninguém”.

Aberto ao diálogo

Daniel Borges ainda cita como exemplo do que deve ser evitado casos em que os donos das empresas, de “cabeça quente”, respondem a críticas de clientes de forma inapropriada. “Às vezes, a reclamação é uma coisa recorrente no estabelecimento e aquele feedback negativo pode orientar o empresário para melhorias que devem ser feitas no negócio dele. Quando a crítica é construtiva, não tem motivo para não ser respondida”, defende.

Outro caso notório, mas dessa vez com desdobramentos negativos para o estabelecimento, aconteceu em São Paulo. Em forma de post no Facebook, uma cliente acusou o bar que frequentava de ter sido conivente com o assédio que ela e uma amiga teriam sofrido no estabelecimento, na noite anterior. A declaração chegou a 140 mil compartilhamentos e rapidamente fez a página do local na rede social virar alvo de protestos. No dia seguinte, pressionada, a empresa fez sua primeira declaração oficial, questionando a veracidade do relato. Em vez de agir com foco no entendimento e solução do problema, preservando sua imagem, o bar entrou na briga e provocou ainda mais críticas, agravando a situação. A partir daí, foram mais cinco publicações tentando se explicar, sem nunca conseguir passar uma mensagem clara à sociedade e aos envolvidos.

Confira abaixo sete erros que devem ser evitados na hora de gerenciar uma crise:

1) Dar a primeira resposta de qualquer forma

A primeira resposta é sempre a mais importante, especialmente, em tempos de internet e redes sociais, em que tudo é reproduzido e compartilhado em alta velocidade.

2) Agir com emoção

Não se administra nada pela emoção. Como uma empresa, todas as atitudes têm de ser tomadas de forma racional e planejada.

3) Não pedir desculpas

É preciso pedir desculpas, pelo menos em casos de experiência negativa do cliente. Quando uma empresa assume que errou, se mostra disponível e isso faz com que aumente o número de interessados em ouvir a mensagem.

4) Terceirizar responsabilidades

Colocar a culpa em terceiros dá a sensação que a ideia é simplesmente “tirar o corpo fora” e essa é uma imagem que certamente não é bem vista aos olhos do público.

5) Entrar na briga

Pior do que não pedir desculpas é confrontar o consumidor publicamente. Nem sempre o cliente tem razão, mas a opinião dele é importante.

6) Demorar a tomar uma atitude

Quanto mais a empresa demora para tomar uma atitude, menos as pessoas irão acreditar na veracidade dela.

7) Ser arrogante

É preciso ter humildade. Ainda que o estabelecimento não saiba o que aconteceu, é necessário assumir a responsabilidade de pelo menos apurar o caso.

*Reportagem originalmente publicada na edição 122 da revista Bares & Restaurantes

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