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O equívoco político, econômico e jurídico do aumento do ICMS em São Paulo precisa ser compreendido no que ele realmente consiste e não pelas justificativas, ou narrativas como se diz hoje em dia, que desejam que aceitemos. O ataque direto contra diversos setores econômicos é mais uma atitude do poder do estado, do Leviatã definido pela ciência política, no sentido de aplicar o poder pleno de interferência na vida dos cidadãos. E de uma forma que sufoque vozes discordantes, subjugue dissidentes, imponha um toque de recolher moral.Como poder nenhum se exerce sem alimentar a máquina de sustentação, a derrama é fundamental nesta política.

É exatamente por deter esta condição que o governador de São Paulo, João Doria, está aumentando a já insuportável carga tributária dos paulistas, e na pior hora possível.

Dória passou a vida elogiando a iniciativa privada e a criticar a carga extorsiva de impostos que os brasileiros suportam e como dificulta o crescimento das empresas, acrescentando que o retorno por parte dos entes públicos é medíocre. Candidato, prometeu não aumentar impostos. Eleito, exerce o poder de forma discricionária.

O discurso de preocupação com a saúde da população por conta da pandemia é contraditório na medida em que impõe aumento de impostos sobre remédios, alimentos e outros produtos essenciais à vida familiar, principalmente, quando se sabe que a sociedade está fragilizada, as empresas lutando para sobreviver, a população assustada. Por todo lado se vê redução de emprego e renda.

A redução de impostos por via administrativa se deu em certos casos porque estavam escorchantes e, politicamente, se impediu judicialização monstruosa, trocando-se um conflito certo por acordo entre Fazenda Estadual e os setores da indústria, comércio e serviços. De outro lado, governadores anteriores que assim agiam queriam estimular a atividade econômica, o emprego etc.


Imposto recai diretamente sobre empresas e as que puderem repassarão ao consumidor. Quem não conseguir é candidato a fechar as portas, ou engrossará a imensa legião das informais, causando instabilidade no mercado, reduzindo a prestação de serviços essenciais, lesando o fisco, agravando a concorrência desleal.

A vida ficará mais cara e a inflação receberá mais um empurrão. O Estado – Leviatã ficará maior e as empresas menores. Fácil entender a medida agora, pois se pode usar a fabricação da vacina contra a Covid como cortina de fumaça.

O setor de restaurantes, na gestão do atual governador, já tinha sido “premiado” com a cobrança de ICMS sobre pescados, retroativo a cinco anos. Milhares de pequenos empresários, que desconheciam essa maldade, que nunca jogaram nos preços esse imposto, pois nunca fora cobrado, acordaram recebendo cobranças milionárias, o suficiente para fazer muitos fecharem as portas e outros a enfrentarem execuções fiscais e mais um drama, como pagar tais dívidas. Milhares estão sendo chamados a responder a execuções fiscais por essa cobrança surpresa.

A derrama de impostos não é um ato isolado, claro. O aumento do ICMS se deu por decretos do governador, após aprovação da Lei Estadual 17.923 pela Assembléia Legislativa paulista.

Juridicamente, a medida está com flagrantes ilegalidades.

A primeira delas porque a lei transfere do Poder Legislativo para o Executivo, ou seja, ao governador, a competência, leia-se poder, de renovar ou reduzir benefícios fiscais relacionados ao ICMS, o que é ilegal e inconstitucional.

Uma outra ocorre quando o aumento do ICMS acaba se dando por decreto e por conclusão e decisão do governador e não de lei, como determina explicitamente a Constituição, onde está dito que: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça. ” E no “Art. 163. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado ao Estado: I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça. ”

Ora, trata-se concretamente de aumento de carga tributária o que ocorre, exige lei e requer que esta venha diretamente do poder competente.

A conduta da Assembleia, já tão isolada da população, a ponto de os cidadãos não saberem o que faz um deputado estadual, despojando-se do poder de aprovar leis e leis tão importante como as tributárias, torna o legislativo ainda mais insignificante, fere o Código Tributário, os princípios da legalidade e da moralidade e a própria Constituição do Estado, da qual deveriam ser guardiões.

Enquanto a ALESP age como intestino do Leviatã, felizmente, acontece o contrário com o legislativo federal, que está impedindo o executivo de cortar isenções fiscais sobre atividades econômicas caracterizadas pelo número de empregos que geram. Como sempre, todo governo quer mais tributos, não há exceção.

Com as empresas, especialmente as de pequeno porte, fragilizadas ao extremo pela pandemia, quebrando, como fica claro no aumento da inadimplência, da informalidade, nos pedidos de recuperação judicial e falência, no aumento das execuções fiscais, por qualquer nesga de inteligência, qualquer pensamento lógico aplicado à situação atual, esse aumento ainda infringe os comandos constitucionais que definem a capacidade contributiva e o confisco.

Muitas pequenas empresas estão sendo intimadas a pagar o que não podem, convidadas a transferirem seus patrimônios para o Estado.

A carga tributária brasileira ultrapassou os 37% do PIB, o brasileiro precisa trabalhar mais de quatro meses para pagá-la, não obstante, a qualidade dos serviços públicos que recebe é sofrível e tão só por aí seria justo que não houvesse aumento.

Depois de apelar ao governador, que atendeu parcialmente apenas alguns setores econômicos do agronegócio (que ameaçavam com tratoraços), vários outros foram ao Judiciário, que se tornou uma tênue esperança de fazer cessar aumentos na carga tributária, perversidade que ameaça se espalhar pelo país.

Há esperança do governador avaliar o vulto do erro cometido e volte atrás na sua decisão? Em tempos como o que passamos, espera-se dos governantes, em todos os níveis, qualidade de gestão na condução dos poderes que assumiram, o suficiente para redução e não aumento da carga tributária.

*Percival Maricato é Advogado e Conselheiro da Abrasel em São Paulo.

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