Desde a aposta do Rubaiyat, outras marcas premiadas — como o Mocotó e A Casa do Porco — ingressaram nas telas do iFood, da Rappi e do UberEats. Foram, em certa medida, pressionadas por uma mudança de comportamento dos paulistanos
O pai era contra. Dizia que a carne chegaria fria à casa dos clientes. Mas os jovens irmãos à frente do Rubaiyat, Victor e Diego Iglesias, acharam que dava pé — e começaram uma parceria com o aplicativo Rappi sem avisar o velho Belarmino, em outubro de 2018. “Fomos pioneiros entre os restaurantes de luxo de São Paulo”, lembra Victor. Deu tão certo que escaparam da bronca. Um ano depois, as vendas por aplicativos atingem R$ 600 mil por mês, ou 8% do faturamento do grupo. E não apenas a carne chega quentinha: as famosas batatas suflê da casa não perdem a crocância na viagem, graças aos truques do mundo das entrega digitais.
Desde a aposta do Rubaiyat, outras marcas premiadas — como o Mocotó e A Casa do Porco — ingressaram nas telas do iFood, da Rappi e do UberEats. Foram, em certa medida, pressionadas por uma mudança de comportamento dos paulistanos. A clientela mais fiel já tinha começado a enviar motoqueiros a esses endereço, pelo botão “qualquer coisa” da Rappi — que permite pedidos específicos, como comprar um prato qualquer para viagem. (Alguns chefs, em off, confessam que dificultavam esse “delivery forçado”.)
O casamento interessava aos aplicativos de comida, que passaram a disputar a exclusividade dos restaurantes estrelados. Mais popular entre clientes de renda elevada, a Rappi conseguiu a exclusividade de marcas como Le Jazz e Marakuthai. O iFood, com maior volume de usuários, tem nomes como Ici Brasserie, Mocotó e Adega Santiago.
Em troca de acordos desse tipo, as plataformas oferecem aos chefs taxas mais baixas (de 15% a 19%, versus até 28% para lugares menos renomados), exposição privilegiada na tela, gerentes de conta exclusivos e até dinheiro para a construção de dark kitchens, cozinhas que funcionam apenas para o delivery dos restaurantes. A Rappi deve terminar o ano com aproximadamente cem cozinhas do tipo construídas no País.
“Quando um cliente entra na área ‘gourmet’ do aplicativo, sabemos que está disposto a gastar mais, o que valoriza esse espaço da tela”, completa Manuel Coronado, diretor comercial do iFood, que tem 995 restaurantes nessa “tela vip” do app, criada em novembro passado.
Tempo e temperatura
Para garantir a qualidade dos pratos no delivery, os chefs precisaram se adaptar. “Um dos principais desafios é a embalagem”, diz Mayra Chinellato, diretora de operações do grupo Fasano. “É preciso ajustá-las para que o pão não resseque, a burrata não solte água, a massa não passe do ponto e a batata não murche”, diz.
As casas mais sisudas do grupo, como o Fasano e o Parigi, não se renderam aos apps – assim como Maní, ShinZushi, Tanit e outros tops que não acreditam que manteriam o nível dos pratos, ou não abrem mão da experiência do salão. Mas, desde julho, o Fasano testa um delivery no Gero Panini, o endereço mais informal da grife. A novidade entra no ar no fim do mês e terá massas, entradas, sanduíches e sobremesas. “Criamos uma embalagem para cada prato”, diz Mayra.
No Rubaiyat, as embalagens ficam armazenadas em uma estufa. “Do contrário, a comida começa a esfriar quando é colocada nelas”, conta Victor. E como a batata suflê não murcha? Primeiro, a embalagem tem furos de “respiração”. Depois, a guarnição só é entregue em um perímetro reduzido — o restaurante atende até a 5 km, mas muda para 3 km se o pedido incluir as batatas. Por fim, o grupo negociou uma vantagem com a Rappi. “Um motoboy que pega nossa entrega precisa levá-la diretamente ao cliente (normalmente, eles podem apanhar outras no caminho)”, ele explica.
Outro cuidado comum é limitar o cardápio. N’A Casa do Porco, por exemplo, só são entregues o porco assado (San Zé), a porcopoca e os sanduíches. “Alguns pratos não chegariam com qualidade”, diz Janaína Rueda, sócia da casa - onde o delivery corresponde a 17% das vendas
Fonte: Estadão