Pesquisa mostra que 74% das pessoas no país passaram a considerar ainda mais os bares, restaurantes e cafés como lugares importantes na manutenção do bem-estar mental
“Bora tomar uma para bater um papo?”. “Que tal almoçarmos juntos para eu desabafar sobre aquele caso?”. Frases comuns e que ficaram suspensas de uso por meses. A pandemia trouxe inúmeras mudanças de comportamento para a sociedade.
Algumas passageiras, outras que chegaram para ficar. Nada de novo nisso. Mas fato é que alguns hábitos do dia a dia passaram a ser mais valorizados após o isolamento social forçado pela chegada do vírus.
O que muita gente não ligava muito ou até evitava, passou a ser de extrema importância, sobretudo quando os assuntos estão relacionados à socialização e à saúde mental.
É o que aponta uma pesquisa publicada pela International Alliance for Responsable Drinking (IARD). O estudo, que foi realizado entre maio e agosto de 2021, e contou com 11.444 entrevistas, com maiores de 18 anos e em diversos países do mundo, revelou o grande impacto e a relevância de bares, cafés e restaurantes no bem-estar social e mental das pessoas no mundo, incluindo os brasileiros.
De acordo com o estudo, após o período de restrições da Covid-19, 74% dos brasileiros entrevistados passaram a valorizar ainda os estabelecimentos em seu dia a dia. Para 71%, o fechamento teve efeito negativo em suas vidas e 60% afirmam que foram afetados durante a pandemia do novo coronavírus.
Reafirmação da vida social. De acordo com a psicóloga clínica da iMEDato Consultas e Exames, Mônica Mafra, durante a pandemia, com o afastamento desses ambientes e a proibição de se manterem interações presenciais, instalou-se um maior sentimento de solidão e uma sensação de perda desses momentos de maior sociabilidade promovidos nos bares e restaurantes, por exemplo.
Só agora, com a reabertura gradual de locais assim, é possível recuperar e ver a real importância de algumas situações.
"O comer e o beber estão intimamente ligados à socialização e esses ambientes são focados justamente em proporcionar esses momentos, que em nosso imaginário estão vinculados à lazer e diversão - o próprio termo happy hour, usado por bares e restaurantes, por exemplo, nos remete a essa ideia.
Agora, com a flexibilização, é como se estivéssemos passando por um processo de reafirmação da importância de situações sociais e, nesse sentido, ambientes que promovem a socialização também recebem mais valor aos olhos das pessoas". Mônica Mafra, psicóloga clínica da iMEDato Consultas e Exames
Na mesma linha. O líder de Desenvolvimento da Abrasel, Lucas Pêgo, analisa esses números de maneira parecida, sob o olhar de quem acompanha a relação desses estabelecimentos com os clientes todos os dias.
“Bares e restaurantes são a principal opção de lazer fora de casa para os brasileiros. Lugares de interação social, de extravasamento, de alegria, de descontração e de celebração. Ainda que estejamos em um crescimento vertiginoso das interações digitais, as interações presenciais, cara-a-cara, sorriso-a-sorriso, são insubstituíveis”, analisa Lucas.
Mais números
Reabertura aumentou o grau de felicidade. Segundo a pesquisa, a retomada do funcionamento desses estabelecimentos e a socialização com os amigos fora de casa têm gerado bem-estar e sentimento de felicidade para 40% dos brasileiros.
Além disso, 33% afirmam que bares, cafés e restaurantes e oferecem espaços significativos para as pessoas se reconectarem com outras a seu redor e evitarem a solidão.
Para a especialista Mônica, os bares, restaurantes e cafés, de forma geral, são ambientes em que a prioridade está na esfera da socialização e do lazer. “essa socialização é um processo de aprendizagem de normas e valores de um determinado meio social ao qual um indivíduo faz parte.
A integração do ser humano à sociedade é um processo que nunca acaba. Por isso, a importância desses lugares. Durante a socialização nos tornamos mais humanos”, diz.
O levantamento ainda revela que para 80% dos brasileiros as medidas restritivas melhoraram a experiência nesses estabelecimentos e as três exigências mais importantes dos frequentadores foram atendidas: 57% consideram que houve melhorias nos padrões de limpeza; 54% disseram que há mais ventilação; e 40% que houve melhorias nas instalações ao ar livre.
Um setor começando a se recuperar
Um pequeno respiro após tempos muito difíceis. Com o avanço da vacinação e o fim das restrições, a expectativa é que a retomada beneficie não só os consumidores, mas toda a cadeia produtiva no Brasil. É o que prevê a própria Abrasel.
De acordo com a associação, o setor pode preencher 600 mil vagas de trabalho apenas neste semestre - o que representa 31% das empresas do setor com intenção de aumentar o quadro de funcionários.
"O setor de bares e restaurantes foi um dos mais afetados pelas medidas de restrições adotadas durante a pandemia, mas os danos vão além dos econômicos. A paixão cervejeira é o marco do nosso país, por isso estamos presentes nas celebrações. Como entidade representativa do setor, nós apoiamos a retomada segura e o consumo responsável", afirma o superintendente do Sindicerv (Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja), Luiz Nicolaewsky.
Um mundo que também sentiu muita falta dos bares e restaurantes
Se ampliados para o âmbito mundial, os números da pesquisa mostram uma tendência parecida com o que foi apontado no Brasil. Quase dois terços dos entrevistados, (66%) concordam que o bem-estar social e mental da população sofreu impacto e 45% reconhecem efeitos negativos diretos em sua saúde com o fechamento dos estabelecimentos.
Além disso, 57% passaram a valorizar ainda mais a contribuição do setor em sua saúde; 22% avaliam que os estabelecimentos evitam a solidão e que a socialização fora de casa, após as restrições, trouxe sentimentos de felicidade (45%).
O que ficou de positivo. A maioria (71%) concordou que as medidas introduzidas por causa do Covid-19 trouxeram melhorias na experiência nos estabelecimentos. Por fim, o resultado geral aponta ainda três aspectos que se tornaram mais importantes desde a pandemia: socializar fora de casa (44%); relaxar e aproveitar o ambiente (43%); desfrutar de comidas e bebidas preparadas por outra pessoa (36%).
Segundo a psicóloga clínica, apesar do afastamento social ter despertado as pessoas para a falta, isso não está necessariamente ligado a um despertar para atitudes que produzam, de fato, a melhoria das relações.
“Apesar da pandemia, continuamos seres relacionais, ou seja, temos necessidade de construir e manter relações. O que ocorreu foi um despertar para o valor das interações sociais para nosso bem-estar. No entanto, muitos ainda estão presos a comportamentos que causam o isolamento, independente de estarmos ou não nesse contexto mais restrito de contato. O uso excessivo do celular, por exemplo, atrapalha muito a construção de momentos de interação de qualidade. Houve um despertar para a importância disso, gerado pela falta, mas é preciso dedicação e cuidado no dia a dia para que a qualidade dessas interações seja preservada e não se perca”, conclui Mônica.
Fonte: Inset